Boeing e Starbucks. Duas marcas icônicas e totalmente diferentes, uma no segmento da aviação e outra no segmento de cafés, enfrentam crises profundas que vão além de meros problemas operacionais. Em ambos os casos, o desafio fundamental que os novos CEOs enfrentam é a restauração do capital de confiança. Mas o que é exatamente esse capital de confiança, e como essas empresas podem recuperá-lo?
A crise da confiança
Confiança é o alicerce sobre o qual toda relação de marca se constrói. Sem confiança, não há lealdade, e sem lealdade, não há valor de marca — e, em última instância, não há valor para o acionista. Pesquisas apontam que a confiança tem um impacto direto no valor da marca, influenciando a percepção dos consumidores e a propensão à recompra. Como o estudo de 2001 sugere, a confiança cria valor ao proporcionar benefícios relacionais derivados de interações consistentes e ao reduzir a incerteza nas transações.
No caso da Boeing, a perda de confiança tem implicações gravíssimas: vidas humanas estão em jogo. No entanto, a crise de confiança da Starbucks, embora de natureza diferente, não é menos crítica para sua sobrevivência. A qualidade da experiência da marca e a promessa de consistência são o que mantêm os clientes voltando. Ambas as empresas, apesar de suas diferenças, compartilham a mesma necessidade urgente de restaurar e fortalecer seu capital de confiança.
O valor do capital de confiança
Capital de confiança é a confiança acumulada que uma empresa possui junto a seus stakeholders, incluindo clientes, funcionários, fornecedores e acionistas. É um ativo intangível que, quando bem gerido, fortalece a marca e proporciona estabilidade em tempos de crise. Sem um capital de confiança robusto, as marcas estão vulneráveis a quedas rápidas em sua reputação e valor de mercado.
Um exemplo recente do impacto do capital de confiança pode ser visto na história do Costco. A filosofia de Sol Price, fundador da empresa, era simples: “Ele preferia perder o negócio do que a confiança do cliente”. Esse foco inabalável na confiança é o que mantém o Costco como uma das marcas mais respeitadas do mercado.
Quatro ações estratégicas para restaurar a confiança
- Criação de uma agenda de confiança
Tanto Boeing quanto Starbucks precisam desenvolver uma Agenda de Confiança que guie todas as suas operações. Isso envolve mais do que apenas cumprir promessas; trata-se de integrar a confiança em cada aspecto do negócio, desde a cadeia de suprimentos até a interação com as comunidades locais. Em minha experiência como consultor, vejo que as empresas que colocam a confiança no centro de sua estratégia conseguem uma recuperação mais rápida e sustentável em momentos de crise.
Uma Agenda de Confiança deve incluir:
- Como construir cadeias de confiança com todos os stakeholders?
- Como integrar a responsabilidade corporativa em todas as decisões?
- Nossas ações são sustentáveis a longo prazo?
A sustentabilidade, por exemplo, é uma área crítica onde a confiança pode ser construída ou destruída. Empresas que não conseguem equilibrar as necessidades atuais com as futuras perdem rapidamente a confiança dos consumidores conscientes.
- O CEO como o diretor de confiança
O novo CEO deve assumir o papel de Chief Trust Officer (CTO). Construir e manter o capital de confiança não pode ser delegado; é uma responsabilidade fundamental do líder máximo. A confiança começa no topo, e é essencial que o CEO se posicione como o guardião dessa confiança. A liderança do CTO deve ser visível, ativa e contínua, com um foco constante na construção de uma cultura de confiança dentro e fora da organização.
- Cumprir o que promete
Nada destrói mais a confiança do que prometer e não cumprir. Boeing deve entregar aviões com qualidade impecável, e Starbucks deve garantir que cada xícara de café entregue a experiência premium que seus clientes esperam. Na minha experiência, clientes fiéis são aqueles que sabem que podem contar com a marca para entregar o que foi prometido — sem falhas.
- Demonstrar liderança, credibilidade, integridade e responsabilidade
Esses quatro pilares são fundamentais para qualquer empresa que deseja restaurar ou aumentar seu capital de confiança. A liderança deve ser proativa e visível; a credibilidade deve ser reforçada por meio de ações consistentes e comunicação transparente; a integridade deve ser inquestionável, com a empresa sempre colocando os interesses dos clientes em primeiro lugar; e a responsabilidade deve ser evidenciada por um compromisso genuíno com a cidadania corporativa global e local.
A confiança é um ativo intangível, mas de valor inestimável. Tanto Boeing quanto Starbucks têm a oportunidade, com novos CEOs no comando, de reconstruir esse capital essencial. Como visto em exemplos como o Costco, onde a confiança foi colocada acima de tudo, as marcas que priorizam a confiança podem não apenas sobreviver, mas prosperar mesmo nos mercados mais desafiadores. Restaurar a confiança não é uma tarefa simples, mas é, sem dúvida, o caminho para uma recuperação sustentável e um crescimento lucrativo a longo prazo.
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Marcos Figueira é sócio da Wyse Brandformance (https://wyse.com.br), um mix de agência e consultoria especializada em Branding e Marketing que atuam de forma integrada.
Referências
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- Este artigo clássico explora a teoria do compromisso e da confiança no marketing de relacionamento, destacando como a confiança é essencial para a construção de relacionamentos duradouros e valiosos entre empresas e consumidores.
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- Este estudo analisa a natureza da confiança em relações comerciais, identificando os principais fatores que contribuem para a confiança entre compradores e vendedores, e seu impacto nos resultados de negócios.
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- O modelo integrativo de confiança organizacional deste artigo fornece uma estrutura compreensiva para entender como a confiança se desenvolve e como influencia o comportamento dentro das organizações.
- Barney, J. B., & Hansen, M. H. (1994). Trustworthiness as a Source of Competitive Advantage. Strategic Management Journal, 15(S1), 175-190. https://doi.org/10.1002/smj.4250150912
- Este artigo discute como a confiança e a confiabilidade podem ser fontes de vantagem competitiva sustentável, sendo elementos críticos para o sucesso a longo prazo das organizações.
- Schoorman, F. D., Mayer, R. C., & Davis, J. H. (2007). An Integrative Model of Organizational Trust: Past, Present, and Future. Academy of Management Review, 32(2), 344-354. https://doi.org/10.5465/amr.2007.24348410
- Este artigo revisita o modelo de confiança organizacional e explora suas implicações futuras para a pesquisa e prática empresarial, enfatizando a importância da confiança como uma base para a eficácia organizacional.